Li recentemente um artigo da Harvard Business Review, publicado em Fevereiro de 2019, intitulado “The 3 Elements of Trust”. Analisando os resultados de uma avaliação 360° a 87 mil líderes, os autores identificam 3 factores preponderantes que levam as pessoas a confiarem mais ou menos nos seus líderes. Eu acrescentaria que os 3 factores podem ser genericamente aplicados a relações entre pessoas, não só no contexto profissional, mas também no pessoal.
Neste artigo, tomo a liberdade de fazer a transposição das conclusões do estudo para o mundo do Procurement. É um processo que não tem base científica, trata-se apenas de um exercício que me ajuda a responder à pergunta que constitui o título deste artigo: afinal, o que leva os nossos clientes internos a confiarem no Procurement, a deixarem-nos entrar nos seus processos de aquisição de bens e serviços, e a delegarem no Procurement a responsabilidade de encontrar as melhores soluções de fornecimento e os melhores fornecedores para as suas necessidades?
Os 3 factores preponderantes são: relações positivas, bom julgamento/expertise, e consistência.
Relações positivas: em parte, a confiança baseia-se na capacidade que a pessoa tem de demonstrar interesse pelos outros, de equilibrar a procura de resultados com entender as preocupações das outras pessoas, de criar cooperação entre pessoas, de dar feedback que seja útil para os outros.
Aplicado ao Procurement: este ponto capta aquilo a que no jargão de Procurement se chama stakeholder relationship management. Aqui, não me refiro a ferramentas e a templates; refiro-me sim à arte e à ciência de criar e alimentar relações positivas com os nossos clientes internos. É imperativo ouvirmos o cliente interno, entender as suas prioridades e os seus “pain points”, e alinhar os nossos esforços para servir as prioridades do negócio. Devemos ouvir activamente, e ouvir duas vezes mais do que falar. É imperativo falarmos a linguagem do business, e não a linguagem do Procurement. Evitem falar de RFI, RFP, SRM, P2P, S2C e outras siglas destas que nós Procurement usamos. É imperativo alinharmos as nossas métricas de performance com as métricas do nosso cliente interno. Porque razão vamos falar de bottom line savings à directora de marketing, quando o que ela quer é mais inovação trazida pelos fornecedores e com um time-to-market mais curto?
Bom julgamento/Expertise: este ponto diz respeito à credibilidade que geramos quando temos conhecimentos técnicos do que falamos, quando demonstramos bom julgamento nas decisões que tomamos, quando somos procurados pelas pessoas que respeitam a nossa opinião sobre um determinado assunto sobre o qual temos competência técnica.
Aplicado ao Procurement: este é um ponto-chave do Procurement, aquilo a que eu globalmente chamaria de category management excellence. Trata-se da nossa competência técnica na gestão das várias categorias de materiais e de serviços que compramos. Aqui não podemos fugir do que é essencial: para categorias importantes ou críticas para a nossa empresa, os nossos clientes internos esperam que o profissional de Procurement saiba tudo sobre a categoria, temos que ser os CEOs da categoria, com expertise no sector, conhecimentos profundos dos fornecedores, das estruturas de custo, das grandes tendências do sector, dos riscos e oportunidades, etc. Trata-se de dar confiança ao cliente interno e à gestão de topo de que a categoria está a ser bem gerida.
Consistência: este ponto descreve a capacidade que a pessoa tem em fazer o que diz que vai fazer, cumprir com as promessas, respeitar prazos de entrega que foram prometidos, e liderar dando o exemplo.
Aplicado ao Procurement: este ponto é interessante transpor para o mundo do Procurement. Quantas equipas de Procurement se avaliam a si próprias como estando a entregar bons resultados e de forma consistente, e quando os clientes internos são sondados, eles dão o feedback que nem sempre a promessa é cumprida, ou noutros casos, dizem que a entrega é mais lenta do que devia e o processo de compra é complicado e às vezes inconsistente? Consistência significa entender as expectativas dos clientes internos, alinhar com eles o que é realístico alcançar, depois executar com disciplina e entregar conforme a expectativa. E fazê-lo repetidamente. Disse Denzel Washington: “without commitment you will never start, but more importantly, without consistency you will never finish.”
Em resumo: com práticas excelentes de stakeholder relationship management, com uma gestão de compras excelente das categorias importantes ou criticas para a empresa, e com um trackrecord excelente de entregar aquilo que prometemos aos nossos clientes internos, nós profissionais de Procurement seremos verdadeiramente trusted business partners, e ganharemos relevância neste mundo de negócios em acelerada transformação. Tem é que ser tudo bem feito… com excelência, pois claro!
Pedro Hugo Rocha, Global Procurement Director Center of Excellence and Contract Manufacturing | Campari Group