Bem além de uma questão limitada à Europa do Leste, a invasão russa está provocando consequências que atingem também a América Latina e têm forte impacto nas importações e exportações de muitos países da região.
Qualquer que seja o desfecho, a invasão da Ucrânia pela Rússia terá consequências muito mais amplas do que se poderia esperar de um conflito restrito à Europa Oriental e afetará diretamente as cadeias globais de suprimento. Ao prolongar-se por mais tempo do que era possível prever no início, em 24 de fevereiro, o conflito já provoca forte impacto nos sistemas de transportes e logística, que passarão por grandes mudanças nos próximos meses, como efeito das sanções impostas à Rússia pela maioria dos países ocidentais.
Apesar da distância física, a América Latina não está imune aos efeitos da situação de guerra, a começar pelo aumento no preço do petróleo e do gás, que provocou, automaticamente, a elevação dos custos logísticos em todo o mundo, principalmente nos de transporte. As empresas do setor têm dificuldade em repassar esse custo adicional aos clientes, o que resulta em redução de margens e em maus resultados de receita.
Ao mesmo tempo, as pesadas sanções contra a Rússia comprometeram dramaticamente as operações de importação e exportação, e muitos embarques já programados tiveram de ser suspensos. Uma grande quantidade de produtos que iriam para a Rússia está se acumulando nos armazéns portuários de países exportadores, como Brasil e Chile, cujos pátios se encontram lotados de contêineres conectados. Como o espaço aéreo russo está fechado, também não há como enviar cargas por esse modal. Isso significa, simplesmente, a interrupção absoluta dos negócios com a Rússia, nos dois sentidos.
Entre os resultados imediatos estão a escassez de alimentos como o trigo e o aumento da inflação puxado pelos preços dos combustíveis, num período em que os setores de logística e de alimentos ainda se encontram em fase de recuperação dos impactos negativos da pandemia de covid-19. Ao mesmo tempo, ainda será preciso avaliar as consequências no médio e no longo prazo da decisão de alguns grandes grupos empresariais de renunciar a seus negócios na Rússia. Na área de navegação, por exemplo, a própria Maersk está anunciando a venda dos seus ativos no país.
Na América Latina, há um justificado sentimento de preocupação, em especial entre os países que são exportadores agrícolas e dependem bastante dos fertilizantes russos e, ao mesmo tempo, estão registrando uma queda nas exportações para aquele país, que é um importante comprador de produtos agrícolas e proteína animal.
O prejuízo maior, sem qualquer dúvida, será o da própria Rússia, que está cada vez mais isolada e marginalizada no comércio mundial e sem margem para reverter a situação no curto prazo. Há uma expectativa em relação à China, outro grande importador de commodities e exportador de produtos acabados, que ainda não manifestou com clareza sua posição em relação à Rússia. A decisão do governo chinês influenciará, certamente, o fluxo internacional de comércio.
Além disso, é preciso lembrar que a Ucrânia abastece, por exemplo, nada menos do que metade do gás néon utilizado no mundo para a produção de chips e semicondutores. O país também é um grande exportador de fertilizantes e de grãos, como milho, cevada e trigo, e a interrupção desse fornecimento já causa aumento no preço dos alimentos nos mercados internacionais.
A invasão russa provocou, ao mesmo tempo, uma inesperada onda de solidariedade entre os Estados Unidos e os países europeus no âmbito da OTAN e fortaleceu enormemente uma aliança que parecia ter papel secundário neste nosso mundo globalizado. Com isso, surgiu um novo componente geopolítico cujo resultado ainda vai requerer análises mais aprofundadas.
A decisão surpreendente de Vladimir Putin de iniciar uma guerra e a reação ucraniana, ainda mais surpreendente, alteraram definitivamente os mercados internacionais e o equilíbrio de forças.
Os analistas preveem que, no inevitável rearranjo que ocorrerá a nível global, os países e as empresas ocidentais vão acelerar o movimento de redução da dependência da Rússia e buscar soluções regionais para manter o fluxo de comércio.
Nós, na Emergent Cold LatAm, assistimos com apreensão à escalada desse conflito irracional e nos preparamos da melhor maneira possível para atender às necessidades dos clientes na região, solidários no enfrentamento dos problemas comuns e confiantes de que, com nossa determinação e nossa ética de trabalho, superaremos mais esse desafio.
Rafael Rocha, Vice-presidente | Emergent Cold Latin America