As crescentes tensões geopolíticas, juntamente com as interrupções nas cadeias de fornecimento, criaram uma tempestade perfeita para o protecionismo. Num dos ambientes macroeconómicos e geopolíticos mais complexos e imprevisíveis das últimas décadas, uma coisa permanece clara: a facilitação do comércio para as pequenas e médias empresas (PME) será vital para a resiliência económica de toda a Europa.
É uma estatística bem conhecida nos círculos comerciais o facto das PME serem a espinha dorsal da economia europeia, representando 99% das empresas e empregando mais de 100 milhões de pessoas. As PME não são apenas essenciais para manter a estabilidade, mas também são fundamentais para desbloquear a inovação e impulsionar o crescimento no continente europeu. Para serem resilientes num mundo volátil, elas devem ser capazes de aceder e alavancar de forma completa as enormes oportunidades geradas pelo comércio global, nomeadamente no que diz respeito à exportação internacional. Veja-se o caso das vendas de comércio eletrónico da Ásia-Pacífico, que devem quase duplicar até 2025, totalizando mais de 2 biliões de dólares.
Numa época em que o sistema de comércio multilateral está sob ameaça crescente, as empresas de todas as dimensões ainda dependem de um comércio aberto e baseado em regras que permitam movimentar bens e serviços através das fronteiras. Um comércio sem atritos possibilita revitalizar os objetivos da Organização Mundial de Comércio (OMC) e, ao mesmo tempo, ratificar ambiciosos acordos bilaterais de livre comércio (FTA), de modo a derrubar as barreiras materiais e imateriais ao comércio.
Devemos, por isso, garantir que todas as empresas – e não apenas as grandes corporações – tenham acesso igual ao mercado global. As PME são sobrecarregadas com barreiras tarifárias e não tarifárias, burocracia excessiva, burocracia alfandegária, bem como com lacunas de financiamento e informação. Estes obstáculos são ultrapassáveis. Algumas mudanças nas políticas nacionais e internacionais poderiam facilitar e melhorar o acesso das PME ao comércio global.
A digitalização contribuiu significativamente para a expansão do comércio e das atividades comerciais transfronteiriças e proporcionou às PME maior visibilidade, acesso mais fácil ao mercado e uma distribuição menos dispendiosa. Os processos digitais têm o potencial de simplificar todos os aspetos das operações comerciais. Entender onde as mudanças nesses processos produziriam maior impacto permitiria apoiar e acelerar a tão desejada transição digital na UE.
Por exemplo, digitalizar processos alfandegários pode simplificar e agilizar o desalfandegamento de mercadorias, reduzir a carga administrativa e ajudar as autoridades a mitigar entraves fronteiriços. No entanto, de acordo com a Customs Capability Database da Global Express Association, dos 139 países pesquisados, um total de 46% ainda não aceita ou processa eletronicamente os dados necessários para a libertação das remessas antes da sua chegada.
O estabelecimento de regras de comércio digital internacional, incluindo a harmonização de normas para apoiar o fluxo de dados transfronteiriço, permitirá que as empresas da UE concorram em igualdade de condições à escala global.
A facilitação do comércio promove a inclusão e aumenta o potencial geral de crescimento, especialmente para as mulheres e para as empresas pertencentes a minorias. De acordo com o International Trade Center (ITC), as empresas exportadoras detidas por mulheres pagam salários mais elevados, são mais produtivas, empregam mais trabalhadores e registam vendas acima da média, quando comparadas com as empresas exportadoras detidas por homens.
Paralelamente a uma maior diversidade e inclusão, alinhada com a transição verde da UE, a sustentabilidade ambiental e social também deve ser defendida e integrada nas estratégias políticas. Acordos que se comprometam a reduzir tarifas e outras barreiras ao comércio de bens e serviços ambientais podem promover o uso desses produtos e apoiar a transição para uma economia mais sustentável.
Por exemplo, o Fórum Económico Mundial estima que a remoção de barreiras tarifárias e não tarifárias em certas tecnologias de energia limpa e produtos de eficiência energética poderia aumentar o seu volume de negócio em 14% e 60%, respetivamente. As melhorarias na facilitação do comércio podem reduzir significativamente a pegada de carbono inerente à movimentação de mercadorias e apoiar a transição para economias e cadeias de fornecimento mais verdes.
O futuro do comércio pode ser justo, inclusivo, sustentável e próspero – e pode acelerar a estratégia de dupla transição da UE; mas apenas com a colaboração frutífera entre governos e entre governos e privados. As autoridades públicas devem continuar a construir e aprofundar as relações com as empresas e garantir que as organizações, de todas as dimensões, estejam representadas e envolvidas no debate sobre este assunto. Isto será essencial, não apenas para remover barreiras e facilitar o comércio para as PME, mas também para a resiliência económica de toda a Europa.
Daniel Carrera | Presidente | UPS Europa