Num mundo acelerado, de grande competitividade e dependência, onde as cadeias logísticas se transcendem e se superam constantemente perante desafios tecnológicos e operacionais de complexidade e diversidade nunca antes vistos é imperativo reconhecer o esforço e a dedicação de quem todos os dias também se transcende e supera para que tudo funcione: as pessoas!
Mas a relação Máquina vs Homem volta a estar na ordem do dia. Tal como na era da 1.ª Revolução Industrial, e de todas as que se lhe seguiram desde então, a dúvida sobre o domínio da máquina e da tecnologia permanece como uma incerteza sobre o futuro. Reavivada agora pela Inteligência Artificial, os receios de uma batalha por muitos considerada inglória, voltam a assolar a humanidade. Não devemos, porém, esquecer que este é, como sempre foi, um caminho sem retorno, e que importa, por isso, reconhecer e valorizar as diferenças: entre o conhecimento da máquina e a sabedoria do Homem, entre a capacidade de processamento da máquina e de sentimento do Homem, usando o que cada um tem de melhor em prol da humanidade.
A promoção de um caminho de maior bem-estar e equilíbrio pessoal e profissional das pessoas nas organizações torna-se, assim, crucial, encontrando-se esta preocupação já reflectida pela Comissão Europeia na abordagem à Indústria 5.0 ou 5.ª Revolução Industrial como também poderá ser designada. Esta estratégia centrada no ser humano assume-se, portanto, como um tema fundamental no desenvolvimento económico afectando intrinsecamente todas as empresas e sectores de actividade, podendo os respectivos impactos serem notados em diferentes áreas.
Métricas de rentabilidade, rotatividade, absentismo, formação e produtividade, entre outras, permitem avaliar a felicidade organizacional. E todas podem ser aferidas como rúbricas de custo ou de investimento! O processo de contratação implica custos com recrutamento e seleção, admissão e integração, formação e período de adaptação, entre outros, ao mesmo tempo que com a demissão se perde estrutura, capital intelectual, aprendizagens anteriores e ritmo no processo de evolução da empresa e das equipas, impactando directamente os resultados.
Investir nas pessoas e em modelos organizacionais win-win, através de uma cultura organizacional alinhada, com modelos de liderança, comunicação e desenvolvimento claros e
objectivos sobre Visão, Missão e Valores intrínsecos são por isso indispensáveis. A promoção de uma cultura de sustentabilidade emocional com respeito pelos limites de cada um torna o trabalho mais humanizado e a conexão mais forte, aumentando o nível de compromisso e, por conseguinte, a qualidade da energia dedicada.
Apostar em colaboração, em liderança, em flexibilidade, em reconhecimento, em crescimento e em validação pessoal é não só investir em pessoas, como investir no negócio. Parafraseando Simon Sinek “100% dos clientes são pessoas, 100% dos funcionários são pessoas. Se você não entende de pessoas, você não entende de negócios”. Assim, relações colaborativas, com uma abordagem top-down & bottom-up, apoiadas por lideranças potenciadoras e comprometidas com esta mudança de paradigma, produzidas de forma consistente e coerente nos diversos níveis da organização, são critérios de excelência e de retenção de colaboradores. Responder ao chamado salário emocional deixou de ser uma tendência e assume-se agora como uma realidade efectiva na captação e retenção de talento. Será fácil perceber porquê se associarmos os conceitos de felicidade e bem-estar ao cumprimento das necessidades básicas do ser humano.
Isso implica, porém, desmistificar o estigma e eliminar os vieses associados a esta mudança de paradigma! Saúde mental e clima organizacional são temas da actualidade e estão na base do crescimento do turnover geracional, sobretudo para Millennials e Gen Z, conforme dados da Gartner. Na mesma linha, dados divulgados pela Fortune e pela Deloitte revelaram que 71% dos CEO’s previram que a escassez de competências e de mão-de-obra seriam o maior factor de perturbação das empresas até 2022, colocando assim maior pressão na necessidade de retenção de colaboradores.
A qualidade da retenção não pode, porém, ser descurada sob pena dos custos de turnover serem substituídos pelos custos de burnout. No entanto, citando dados da OMS, Christopher Prinz, analista da OCDE, referiu na 1ª edição do Congresso Nacional de Saúde Mental, em Novembro de 2023, que Portugal é o país europeu com maior risco de burnout ocupacional. A saúde mental revela-se então como um dos maiores riscos de turnover voluntário para as empresas, sendo tanto ou mais incapacitante do que um problema físico. É urgente, por isso, promover e medir o bem-estar dos colaboradores e utilizar questionários e metodologias sistémicas para tal.
Da mesma forma que a economia comportamental estuda as influências sociais, emocionais e cognitivas face a um comportamento económico, revelando hábitos, emoções, medos, ilusões e influências – apontando caminho ao Marketing -, o mesmo princípio pode ser usado para aferir tendências e realidades relacionais e comportamentais dentro de uma organização, percebendo-se assim os benefícios que o desenvolvimento desta abordagem psicológica positiva pode ter na gestão dos Recursos Humanos.
A verdade é que este reenquadramento analítico confere objectividade ao processo, potenciando modelos preditivos. Para além de devidamente sustentados por dados, tais
modelos permitem apresentar projecções que, com base em diferente variáveis de bem-estar, podem impactar diferentes áreas de custo da empresa.
Voltando à Logística e à pressão diária da gestão das cadeias de abastecimento, importa assim considerar que pessoas emocionalmente saudáveis são mais focadas, mais comprometidas com novas soluções e mais resilientes quando confrontadas com acontecimentos ou situações de stress, características comportamentais de excepção nesta área de actividade. Valorizar estas pessoas é contribuir para a organização de equipas, optimização de processos, redução de custos, aumento de responsabilidade social e ecologia ambiental e emocional.
Fazer este alinhamento com o propósito das organizações é, por isso, vital para o seu sucesso. Enquanto membro mais recente das reuniões de board caberá também à direcção Logística mostrar que a inovação e o crescimento acontecem igualmente a este nível, no dia-a-dia, no desenvolvimento das actividades primárias e secundárias, desde o escritório ao chão de fábrica, promovendo assim relações de parceria e colaboração que se traduzem na felicidade e bem-estar das suas equipas. Esta é também a oportunidade da Gestão Logística e de Supply Chain se destacar pela diferença e de liderar pelo exemplo, alinhando já com a Indústria 5.0.
A autora escreve sob pré-acordo ortográfico.
Cláudia Penhas | Supply Chain Specialist