A 12.ª edição do “Benchmarking Supply Chain”, conduzido pela GS1 Portugal, serviu de base para uma conversa aprofundada com João de Castro Guimarães, diretor-executivo da organização. O estudo, consolidado como referência no setor, dá uma visão clara sobre os desafios, tendências e oportunidades nas cadeias de abastecimento, este ano com grande ênfase a ser colocada na colaboração entre fornecedores e retalhistas.

Num cenário em que a supply chain tem sido testada por pressões globais e exigências crescentes, a nova edição do estudo revela dados importantes sobre a performance operacional e a necessidade de inovação contínua. João de Castro Guimarães comenta alguns dos pontos mais relevantes resultantes desta edição e como a organização que dirige tem ajudado as empresas a enfrentar os desafios e identificar oportunidades de melhoria na gestão das suas cadeias de valor.

SCM – Num ano em que a supply chain tem estado debaixo de pressão, com que expectativas partiram para esta edição do estudo “Benchmarking Supply Chain”?
João de Castro Guimarães – Com a expectativa de voltar a colocar ao serviço das cadeias de valor uma ferramenta que as continuasse a servir como instrumento fulcral de colaboração e de melhoria contínua.  É essa a relevância que os vários operadores das cadeias de valor reconhecem ao Benchmarking Supply Chain, ano após ano, e tem sido esse o fator crítico de sucesso desta nossa iniciativa.

Conhecendo a pressão acrescida a que as cadeias de valor têm, de facto, estado sujeitas, em termos dos principais indicadores, admitíamos, como hipótese, que o retalho fosse sensível a essas circunstâncias – muitas das quais exógenas – e que isso se traduzisse num foco acrescido nas variáveis inerentes à receção e disponibilização de produto nos lineares.

 

A GS1 Portugal já tem um histórico com o “Benchmarking Supply Chain”. Como olha para a evolução do mesmo?
Com satisfação, evidentemente, mas com um correspondente sentido de responsabilidade. Este é um projeto anual, que iniciámos em 2013 com a participação de apenas 12 fornecedores e 5 retalhistas. Ao longo destes 12 anos o estudo foi sendo constantemente revisto, para garantir a respetiva melhoria contínua: mantivemos a metodologia que lhe garante um grau significativo de comparabilidade, mas procurámos adaptá-lo, acrescentando-lhe elementos de inovação que o dotaram de robustez e relevância reforçadas. Estes aspetos foram-se traduzindo num número crescente de participantes, tendo o estudo chegado a contar com mais de 30 fornecedores e 10 retalhistas.

Para além disso, o “Benchmarking Supply Chain” dispõe de elementos particularmente diferenciadores: conta com o contributo da avaliação de lojas, plataformas e da central de cada retalhista e, para além disso, disponibiliza uma análise bidirecional do nível de serviço, planeamento, sistemas de informação, colaboração e perceção de sustentabilidade dos participantes. Este aspeto, em particular, é um exemplo claro da forma como perspetivamos a evolução deste estudo: não apenas procurando a garantia da comparabilidade, pela manutenção dos aspetos fulcrais da metodologia e das premissas de avaliação que mais preocupam as cadeias de valor mas, sobretudo, pela identificação de tendências e preocupações com impacto na operação das cadeias de valor. Considerar as dimensões da sustentabilidade é disse exemplo.

 

Quais foram os resultados mais destacados nesta edição ou os que mais o surpreenderam?
O mais surpreendente, pela positiva, como confirmação de uma expectativa que tínhamos, foi a consistência das prioridades: em termos gerais, as prioridades dos retalhistas mantêm-se bastante alinhadas com as do ano anterior, o que resulta da consciência de que, o que há a fazer para garantir uma crescente eficiência da colaboração e dos níveis de serviço, não pode ser constantemente diferente e que, sobretudo num contexto de elevada pressão sobre as cadeias de valor o foco deve incidir sobre temas eminentemente operacionais, como o nível de serviço em promoções, o cumprimento do lead time e o acondicionamento da mercadoria. Do lado dos fornecedores, pela mesma razão, a necessidade de garantir entregas de mercadoria sem danos e de acordo com planograma, sem atrasos ou falhas, é também um resultado que se destaca e que denota a mesma preocupação com a eficiência operacional.

 

“O mais surpreendente, pela positiva, como confirmação de uma expectativa que tínhamos, foi a consistência das prioridades.”

Como se comparam estes resultados com os das edições anteriores?
De um modo geral, os resultados desta edição dão conta de uma melhoria do desempenho, traduzida numa melhor avaliação dos fornecedores: note-se que este foi o terceiro ano consecutivo em que os fornecedores melhoram a sua avaliação em termos médios. Este é, claramente, um indicador de consistência, em linha com o que referimos anteriormente, atestando que estamos perante um mercado cada vez mais competitivo e de excelência operacional.

 

Pode explicar as principais diferenças nas prioridades entre retalhistas e fornecedores?
Por força do respetivo posicionamento nas cadeias de valor, estes dois elos fulcrais têm prioridades ligeiramente diferentes, mas que, em certa medida, confluem para uma global garantia de eficiência. No lado do retalhista, a preocupação mais evidente é a receção de produto na sua totalidade, sem erros, bem acondicionado e dentro do prazo estabelecido. Para o fornecedor, a prioridade é a colaboração com o retalhista, a coordenação horária das entregas e o tempo de espera para a descarga.

Ainda assim há temas transversais e que são considerados muito relevantes para estes dois elos fulcrais da cadeia de valor, nomeadamente, a relação de proximidade e comunicação entre fornecedor e retalhista e também a atualização e alinhamento de dados mestre, um tema que nos é tão caro e que toca diretamente a utilização no nosso Sistema de Standards.

 

Como é que isso afeta a eficiência da cadeia de abastecimento?
As diferenças nas prioridades entre retalhistas e fornecedores têm a ver com a natureza distinta da atividade de cada um mas, de modo sinérgico, contribuem para a eficiência e excelência dos níveis de serviço dass cadeias de valor, assentes na colaboração.

Retalhistas e produtores analisam, com este estudo, os respetivos níveis de serviço em colaboração e procuram um alinhamento para se focarem conjuntamente no que é mais impactante para a cadeia de valor como um todo: a eficiência. O Benchmarking Supply Chain enfatiza a importância da colaboração como veículo de otimização de processos e trabalho colaborativo, para uma perspetiva com impacto benéfico na cadeia de valor.  É um excelente indicador de oportunidades de melhoria que, monitorizadas e revistas pelos envolvidos, como se tem registado, tem impacto positivo na edição seguinte do estudo.

 

Quais são os principais desafios que a cadeia de abastecimento enfrenta atualmente?
São, como se referiu, desafios eminentemente operacionais que visam garantir a eficiência das cadeias de valor em circunstâncias de muito elevada pressão. A agilidade das entregas, o cumprimento dos pedidos em períodos promocionais e os crescentes pedidos especiais (não planeados) traduzem-se em grandes desafios logísticos e de transporte.

Adicionalmente, em termos de acondicionamento, o cumprimento dos diferentes requisitos dos clientes – seja através da configuração da mercadoria na palete, seja na etiquetagem – provoca dificuldades de gestão e adaptação do lado dos fornecedores.

Para além destes desafios práticos, tangíveis, dia a dia, da cadeia de valor, começam a antever-se e enunciar-se os desafios futuros, mas de um futuro que parece cada vez mais próximo e que, em alguns casos, se está a tornar presente: a necessidade de agregação, partilha e acessibilidade a dados da cadeia de valor começa a impor aos operadores a necessidade de considerarem simbologias com essa capacidade de agregação e partilha. A simbologia bidimensional, em que a GS1 Portugal está cada vez mais capacitada é, nesse sentido, uma oportunidade. Estamos, neste âmbito, a disponibilizar à comunidade empresarial o nosso apoio à adoção e implementação, seja em termos gerais, seja na resposta a novos requisitos de que o Regulamento de Prevenção da Desflorestação e Degradação Florestal é exemplo.

 

“Retalhistas e produtores analisam, com este estudo, os respetivos níveis de serviço em colaboração e procuram um alinhamento para se focarem conjuntamente no que é mais impactante para a cadeia de valor como um todo: a eficiência.”

 

Como é que estão a trabalhar para ajudar a superá-los?
No que aos desafios operacionais se refere, temos vindo a promover a comunicação e colaboração entre os parceiros de negócio, além de divulgar e promover boas práticas da gestão da cadeia de abastecimento. Somos um parceiro de confiança, tanto para fornecedores, como para retalhistas, e com ferramentas de que o Benchmarking Supply Chain é exemplo, apoiamos a comunidade empresarial na otimização dos seus processos.

Para além deste estudo, apoiamos ainda a comunidade empresarial com a disponibilização de ações formativas dedicadas e com um conjunto de serviços de valor acrescentado que contribuem também para a otimização da eficiência.

 

Que tendências identificaram, especialmente em relação à tecnologia e à sustentabilidade?
A sustentabilidade é um tema que tanto fornecedores como retalhistas têm vindo a colocar nas suas prioridades, embora ainda não o integrem na respetiva operação com o mesmo nível de maturidade. Há projetos de sustentabilidade a serem desenvolvidos entre fornecedores e retalhistas, mas o maior esforço continua a ser de forma isolada.

No que se refere à tecnologia, é apontada nesta edição do Benchmarking Supply Chain sobretudo ao nível da digitalização da logística, sendo que ainda existem muitos constrangimentos sentidos pela cadeia de valor, sobretudo ao nível da necessidade de integração de sistemas. A introdução de inteligência artificial na cadeia de valor é também apontada como uma tendência, mas que ainda tem um longo caminho para se desenvolver. Por fim, a omnicalidade em que a tecnologia é a base e, neste caso, cada retalhista tem a sua realidade específica.

 

Que áreas de melhoria foram identificadas para fortalecer a colaboração entre retalhistas e fornecedores?
Nesta edição foi destacada a necessidade de um interlocutor pivot para contacto entre os dois elos da cadeia de valor. Este foi um dos fatores mais salientes. A colaboração é crucial, seja para melhoria de processos ou mesmo para solucionar pequenas situações/incidentes do dia-a-dia e o contacto privilegiado entre fornecedor e retalhista contribui para fomentar a colaboração. Esta colaboração deve ser impulsionada pelos departamentos de logística e Supply Chain de toda a cadeia de valor. O ponto fulcral é que seja algo mais operacional e não passível de ser influenciado pela relação comercial.

 

Que boas práticas podem ser destacadas?
São múltiplas as boas práticas a destacar, mas permito-me sublinhar as que são unânimes e consubstanciam procedimentos fáceis de implementar e que podem servir de exemplo para outras organizações, como inspiração, nomeadamente a definição de um contacto privilegiado, o agendamento de reuniões periódicas, a implementação colaborativa de projetos de melhoria logística, a coordenação de horários de descarga, apenas para citar alguns dos exemplos que todas as organizações podem adotar para si, com a consciência de que serão valorizados por parceiros de negócio e terão impacto na eficiência.

 

Como vê o futuro da supply chain em Portugal, especialmente num cenário de crescente competitividade e digitalização?
Acreditamos que o futuro da supply chain em Portugal passa pela maior colaboração e trabalho em parceria entre os diferentes players da cadeia de valor. É com esse foco que a GS1 Portugal lidera projetos como o Benchmarking Supply Chain, mas também comités e grupos de trabalho que permitem às empresas manter-se conectadas e discutirem temas relevantes para uma melhor e mais eficiente cadeia de abastecimento.

 

“A colaboração é crucial, seja para melhoria de processos ou mesmo para solucionar pequenas situações/incidentes do dia-a-dia e o contacto privilegiado entre fornecedor e retalhista contribui para fomentar a colaboração.”

 

Que mensagem gostaria de deixar às empresas que desejam melhorar a sua eficiência na cadeia de abastecimento?
A GS1 Portugal deixa a toda a comunidade uma mensagem de colaboração. Somos o parceiro de confiança das empresas em Portugal. Para além do nosso Sistema de Standards, fulcral para a eficiência das cadeias de valor, disponibilizamos um portefólio de serviços que acrescentam valor à eficiência dos nossos standards e que têm efetivamente um enfoque na promoção da sustentabilidade das cadeias de valor e no apoio à respetiva transição digital. Tem sido assim nos nossos dois últimos planos estratégicos, com reconhecimento dos nossos parceiros e associados. O serviço de apoio à elaboração de relatórios de sustentabilidade, o cálculo da pegada de carbono que disponibilizamos, o programa Lean & Green de redução das emissões de dióxido de carbono equivalente nas operações logísticas e de transporte são casos concretos de iniciativas e serviços que lideramos e com que temos promovido a sustentabilidade da comunidade empresarial. O serviço Validata, de recolha de dados de produto; a nossa plataforma Sync PT, de agregação e partilha desses dados, são exemplos do nosso apoio à transição digital. A isto acresce o facto de representarmos, junto do Comité Europeu de Normalização, o Grupo de Trabalho do Passaporte Digital de Produto, constituído por 14 entidades, na qualidade de entidade que Preside e Secretaria este Grupo de Trabalho, criado pelo Instituto Português da Qualidade. Para além disso, uma nota final sobre a nossa capacidade formativa materializada nas ações que disponibilizamos, no nosso portefólio formativo, e que ministramos em parceria com entidades de renome – como o Programa de Aceleração em Gestão para Micro e PME, em colaboração com o ISCTE Executive Education, em curso.

 

Como é que as empresas podem participar em futuras edições do estudo?
Para participarem em futuras edições do estudo basta contactarem com a GS1 Portugal, pelos contactos gerais ou a equipa de coordenação do estudo. Teremos todo o gosto em apresentar os detalhes deste projeto e contar com mais empresas para enriquecer esta ferramenta consensualmente reconhecida por fornecedores e retalhistas como instrumento de eficiência operacional.