Foi sob o signo da colaboração que decorreu a edição de 2024 da FMCG & Retail, iniciativa da Supply Chain Magazine que esta terça-feira, 3 de dezembro, reuniu profissionais do setor no auditório da Auchan Retail Portugal. Foi uma tarde de debate em que emergiu a convicção de que, face aos desafios emergentes e às lições aprendidas com a pandemia de Covid-19, a supply chain tem de estar no centro das operações.
Estes tópicos foram transversais a todo o evento, mas mereceram destaque na mesa-redonda “Grande consumo e retalho: onde para a logística”, o mote, aliás, da conferência. Com moderação da executive director of supply chain & logistics consulting da Logistema, Bárbara Fraga, convocou dois representantes da indústria – o manager logistic platforms do Super Bock Group, Jorge Correia, e o country supply chain director da Bel Portugal, Ricardo Marques – e outros dois do retalho – a logistics & supply chain director da Auchan, Ana Leandro, e a area manager supply chain da MC, Luísa Santos.
E, em tempos de grandes transformações, nomeadamente por via da mudança de hábitos dos consumidores, das inovações tecnológicas e dos desafios globais, as empresas enfrentam novos paradigmas. E a colaboração é um deles, tendo merecido a concordância dos quatro oradores. Porém, de acordo com Ana Leandro, a colaboração deve extravasar o âmbito típico dos stakeholders, estendendo-se às várias dimensões externas do ecossistema, dada a complexidade do mundo atual.
A pandemia – sublinhou a porta-voz da Auchan – “veio tirar as dúvidas quanto à importância da colaboração para a cadeia de abastecimento”, deixou claro qual a vantagem competitiva de se trabalhar de forma colaborativa em toda a cadeia e demonstrou qual a efetiva criação de valor da colaboração.
Foi uma altura em que – reforçou o representante da BEL Portugal – “as empresas baixaram as barreiras, expuseram-se a terceiros e arranjaram soluções até aí impensáveis”. “As empresas perceberam que a supply chain tem de estar no centro das operações e não podemos permitir que a tirem do centro”, comentou, corroborado pelo responsável do Super Bock Group, em cuja opinião “a supply chain tem hoje um posicionamento que não tinha no passado”.
A pandemia constituiu uma disrupção, levando a porta-voz da MC a sustentar que, dado que as disrupções são aceleradoras, está na altura de uma nova abordagem. Nomeadamente tirando partido das potencialidades da Inteligência Artificial, dado que permite “tratar os dados como nunca”, por exemplo, prevendo as vendas com maior granularidade, com benefícios para os fabricantes e para os retalhistas.
A colaboração sublinhada nesta mesa-redonda esteve em palco logo na primeira intervenção da sessão, a cargo de Maria João Amaral, gestora de estudos de mercado da GS1, que apresentou as principais linhas da mais recente edição do “Benchmarking supply chain”. Trata-se de uma ferramenta para a eficiência e melhoria continua que faz um levantamento das prioridades de retalhistas e fornecedores.
Foram identificadas cinco macrotendências: a colaboração é uma delas, a que se junta a sustentabilidade, a transição digital, os standards, e os desafios da atualidade. O que se verificou foi um contraste de prioridades entre os dois grupos, mas a partilha de informação e a colaboração emergiram como comuns.
Este estudo da GS1 constitui uma ferramenta para a eficiência e foi também de eficiência que falou a oradora seguinte, a general manager da Keta Foods, Anabela Marcelino. Foi uma oportunidade para conhecer melhor esta empresa portuguesa criada há 16 anos e cujo desempenho suscitou o interesse de uma multinacional, a Takana Holdings, que integra atualmente.
Tendo como foco a importação de produtos alimentares asiáticos, começou com um armazém de 200 m2, tendo crescido, entretanto, para uma área de 1300 m2, a que se junta uma arca frigorífica de 250 m2, já insuficiente para a operação, e uma cozinha profissional de 100 m2. A eficiência anda de mãos dadas com a sustentabilidade, tendo a responsável pela empresa anunciado que, embora não haja obrigatoriedade de reporte, por ser uma PME, está em curso a certificação com a norma ISO 2200.
A eficiência continuou em foco na intervenção seguinte, a cargo de João Mateus, business unit director da Adecco. Os desafios do mercado laboral e as soluções para aumentar a eficiência na supply chain foram o fio condutor da visão que partilhou, a partir do Deloitte Global Retail Outlook de 2024, segundo o qual a redução de custos está no topo das prioridades, colocando preocupações ao nível do recrutamento, nomeadamente dos chamados frontline workers. Na perspetiva da consultora, o outsourcing de algumas das atividades pode constituir a resposta para esta prioridade.
Um outro estudo, este da Adecco, aborda as exigências que o crescimento do e-commerce e do last mile vieram colocar sobre os recursos humanos. A partir de 2020, muitas empresas – notou – ficaram com vagas por fechar na área da logística, cenário compensado em parte pela imigração. Com a realidade laboral a mudar, o desafio consiste em tornar a logística atrativa para os candidatos, e ao mesmo tempo oferecendo outro tipo de soluções aos clientes, aqui voltando a emergir o outsourcing, permitindo às empresas focarem-se em atividades core do negócio.
São, no fundo, parcerias sustentáveis como a protagonizada pela Comp-RAR, a central de compras do Grupo RAR, e pela IPP Pooling. Representada pela sales director iberia, Ana Ferreira, a IPP é uma empresa especialista em equipamentos de carga que aluga em regime de pooling, deste modo circulando com mais eficiência numa economia partilhada com benefícios económicos e de sustentabilidade.
Foi em 2021 que firmou o contrato com Comp-RAR, que, de acordo com o procurement director, Luís Lima Vasconcelos, procurava um parceiro que se ajustasse à dimensão do grupo, significando isso que teria de se integrar com a grande distribuição, mas também com pequenos distribuidores. Com a implementação das paletes em sistema pooling, verificou-se uma diminuição do desperdício, bem como o aumento da produtividade. A nível da sustentabilidade, é uma operação com zero emissões, pois são compensadas pela IPP. E, a nível do negócio, verificou-se uma redução de custos, atingindo-se os objetivos de qualidade do serviço.
De outra natureza são as ferramentas proporcionadas pela Devlop, cujo sales manager, Romeu Klug, partilhou a visão da empresa sobre a transformação digital e o seu impacto na otimização do armazém ao procurement, bem como na sustentabilidade.
E, neste campo, deu conta de que há uma maior sensibilização das empresas de transporte para o tópico das emissões de gases com efeito de estufa, no entendimento de que se trata de uma vantagem competitiva. Neste domínio, a Devlop desenvolveu uma aplicação que permite quantificar as emissões das diferentes alternativas de transporte, com essa medição a constituir já um critério de seleção de um fornecedor.
Otimização de processos é, igualmente, um tema relevante para o Grupo Constant, como atestou a country manager, Andreia Nunes, numa intervenção subordinada ao tema “O desafio de pensar nas pessoas, sem pessoas”. E para a qual contou com a colaboração de dois outros elementos da empresa, André Gomes da Costa, e Ricardo Reis.
Levou ao evento os últimos dados de um estudo dos CTT sobre o e-commerce em Portugal, segundo os quais cada português compra online uma vez em cada três meses, com o perfil socioeconómico dos e-buyers a concentrar-se nos escalões com rendimentos na ordem dos 1600 euros por mês. Não obstante um em cada três consumidores terem gastado mais em compras online em 2024, 78% destes compradores também o fazem offline.
Estes dados mostram – afirmou – que o e-commerce veio aumenta os desafios da supply chain, no que toca à gestão de stock, ao rigor do processamento dos pedidos, à rapidez da entrega e à logística inversa.
E, a propósito de supply chain, na resposta ao mote da conferência – “Onde para a logística?” – as respostas foram sintetizadas na mesa-redonda final, cujos participantes se dividiram entre a perspetiva de que, no grande consumo e no retalho, o ciclo se encerra na prateleira e/ou na casa do consumidor ou de que é um circuito em constante movimento, impulsionado pela lógica da sustentabilidade.