“Estes novos desafios empresariais que as empresas do setor logístico enfrentam exigem competências técnicas e humanas novas e cada vez mais difíceis de encontrar. Assistimos, por isso, a um desencontro entre aquilo que são as necessidades de competências das empresas e as que realmente são detidas pelos colaboradores e candidatos.”
Os últimos anos trouxeram inúmeras mudanças à economia, impulsionadas pela pandemia e pela crescente digitalização. Esta disrupção afetou praticamente todos os setores, e as empresas de logística não foram exceção. Entre as várias transformações, temos assistido ao acelerar na evolução dos hábitos de consumo dos consumidores e à alteração dos seus canais preferenciais de compra, que passaram para incluir o online de uma forma muito mais significativa. Desta forma, surgiram novas exigências no que respeita à experiência de compra, que se espera mais rápida, bem como mais personalizada. Paralelamente, assiste-se também ao reforço da automação, ao aumento da conectividade e à cada vez maior importância da análise dos dados dos clientes, que podem ser transformados em informação relevante para o setor.
Estas e outras transformações na atividade logística, que exigiram e continuam a exigir também uma transição digital do setor como um todo, vêm tornar necessária uma maior preparação das suas empresas a nível do talento disponível para responder aos novos desafios. Consequentemente, as empresas procuram hoje competências e cargos cada vez mais especializados e de carácter digital, bem como reforçam a necessidade de contratar profissionais ligados ao last mile delivery, devido à crescente necessidade de responder às exigências deste momento do processo de compra, com o quick-commerce a ser uma tendência em expansão.
Estes novos desafios empresariais que as empresas do setor logístico enfrentam exigem competências técnicas e humanas novas e cada vez mais difíceis de encontrar. Assistimos, por isso, a um desencontro entre aquilo que são as necessidades de competências das empresas e as que realmente são detidas pelos colaboradores e candidatos. Assim, e apesar dos empregadores afirmarem que pretendem recrutar, com o setor Logístico a apresentar uma Projeção para a Criação Líquida de Emprego de +28% para o próximo trimestre, segundo o ManpowerGroup Employment Outlook Survey, a escassez de talento, que se sente, não só em Portugal como em todo o mundo, parece ser um obstáculo para o conseguirem.
Segundo o Talent Shortage Survey 2022, recentemente publicado pelo ManpowerGroup, 85% dos empregadores portugueses assumem ter dificuldade em recrutar os profissionais que necessitam, percentagem que nos posiciona acima da média global, que se encontra nos 75%, e como o segundo país do mundo onde este obstáculo é mais acentuado. Neste contexto, as atividades logísticas são das mais afetadas, ao apresentarem uma escassez de talento de 87%. Ao mesmo tempo, e ao analisarmos de forma transversal aos diferentes setores, vemos ainda que as funções de operações e logística, são das mais procuradas pelos empregadores portugueses, sendo referidas por 20% das empresas, ocupando a terceira posição na lista das funções com maior demanda, depois da Tecnologia e Data, com 26%, e da Indústria e Produção, com 21%.
Este cenário de escassez vem, assim, criar uma maior competitividade na busca pelo talento e afeta diretamente às empresas de Logística e Transportes. Face a esta situação, que estratégias podem as empresas adotar para poder atrair e fidelizar os profissionais que necessitam? Mais do que nunca, este é um momento para empresas ouvirem os seus colaboradores e candidatos e procurarem alinhar as suas propostas de valor com as preferências dos profissionais que querem atrair. E cada vez mais, estes pedem uma maior diversidade de benefícios e uma resposta personalizada.
Há um conjunto de prioridades que são transversais a todos trabalhadores. A remuneração, surge como a primeira dessas prioridades, e assistimos hoje a uma revisão das propostas salariais e benefícios financeiros por parte de muitas empresas do setor. No entanto, outros elementos ganham uma importância crescente para todos os trabalhadores, sendo a flexibilidade um dos mais relevantes. Embora o trabalho remoto não seja fácil de implementar em muitas atividades logísticas, os empregadores devem procurar alternativas que permitam melhorar o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. Uma maior flexibilidade na gestão de turnos, bem como mais dias de férias ou horas livres para uso pessoal podem responder a esta necessidade.
A estes, junta-se a aposta na formação e no desenvolvimento de competências. Aliás, este último ponto assume uma importância acrescida neste mercado em especial. A aposta em programas de reskilling e upskilling, permite às empresas ampliar a sua base de talento, atraindo trabalhadores sem experiência prévia, mas com competências transferíveis, que lhes permitirão rapidamente assumir novas funções neste setor. Ao mesmo tempo, é uma importante ferramenta para comprometer os atuais colaboradores, oferecendo-lhes oportunidades e percursos de desenvolvimento, que os capacitem comas skills técnicas e digitais mais procuradas, assegurando a sua empregabilidade futura e permitindo às empresas responder aos desafios trazidos pela digitalização do setor.
Finalmente, as empresas logísticas devem prestar uma atenção acrescida à sua marca de empregador e, em particular a elementos como o propósito e os valores. Os trabalhadores querem sentir orgulho daquilo que fazem e da organização a que pertencem. De acordo com o estudo “What Workers Want to Thrive”, do ManpowerGroup, 64% dos trabalhadores querem que o seu trabalho diário ajude a sociedade e 2 em 3 trabalhadores querem trabalhar para organizações com valores próximos dos seus. Assim, as organizações bem-sucedidas nas suas estratégias de atração de talento serão aquelas que criem e invistam numa cultura de cuidado e bem-estar dos seus colaboradores e numa atuação transparente e socialmente responsável como parte das suas prioridades empresariais.
Para além de trabalhar nas suas propostas de valor de empregador, as empresas de logística e transporte devem ter em mente que, para contornarem os atuais desafios na atração de talento, devem olhar para um futuro que consista cada vez mais na integração de novos canais de recrutamento, cada vez mais sociais e mobile first. Devem ainda potenciar e capitalizar os benefícios da tecnologia. As ferramentas analíticas, as avaliações psicométricas, o desempenho preditivo e o recurso a soluções de Inteligência Artificial permitirão aos recrutadores mapear a sua força de trabalho – atual e potencial – como nunca antes, gerando insights que permitam construir estratégias eficazes de resposta à atual escassez de talento.
Acredito que as pessoas continuarão a ser o recurso mais importante nas empresas de logística. Por isso, se ambicionamos um processo de digitalização bem-sucedido para o setor, será necessário assegurar a inclusão e integração de todos os que o compõem e que trabalham para o seu desenvolvimento, com a vertente humana a ser a chave para um futuro sustentável.
Vítor Antunes | Managing Director | Manpower