A prática de renegociação de preços tem-se transformado, numa rotina quase diária desde novembro de 2021 (em sequência da disrupção das cadeias de distribuição mundial pós pandemia e da Guerra na Ucrânia). A cadência absolutamente vertiginosa com que as organizações recebem comunicações de aumentos de preços, estão a condicionar fortemente a capacidade de analisar e influenciar positivamente os efeitos da inflação do cabaz de compras da maior parte das organizações.
Por a função ‘compras’ constituir o ‘core’ do serviço que prestamos, continuamos empenhadamente a promover reuniões regulares de discussão de preços, no sentido de “mitigar”, por vezes com expressão, os sucessivos aumentos.
Em reunião recente com um fornecedor com alguma relevância no cabaz de compras de um cliente, e face à inconsistência dos argumentos apresentados para justificar os aumentos de preços, insisti em tentar perceber a dimensão aparentemente excessiva dos mesmos. Ato contínuo o meu interlocutor responde “Ó Xôr Dr. Isto agora é bar aberto”!!!
Compreendendo a minha incredulidade, esclareceu;
“Isto é assim: aumentam-nos os preços, nós já nem negociamos/discutimos, acrescentamos um bocadinho por conta da próxima atualização e transferimos tudo para os ‘clientes’. O mercado aguenta tudo!”
As consequências desta prática, infelizmente, não isolada, são já conhecidas de todos nós: a Inflação em outubro passou os 10% e algumas “categorias”, registam valores acima dos 40% e apesar da “relativa” desaceleração, não nos parece que possamos contar com inversão deste cenário nos próximo 4 ou 5 trimestres.
Assim mesmo, a boa notícia é que aparentemente o “tema” começa a aparecer na agenda de prioridades das Empresas. Em recente artigo publicado no Expresso, intitulado “A nova pandemia”, João Vieira Pereira comenta:
“Quem controla os preços? Quem verifica se produtores, intermediários e distribuidores estão a subir os preços no peso, conta e medida do aumento dos seus custos, ou se estão a ir muito além do que seria normal?”
Na minha opinião, resulta claro que não se estão a subir os custos na justa conta peso e medida e se está a ir muito além do que seria normal.
A questão que se coloca é se todos, na cadeia de valor estão a fazer a sua parte? E manifestamente não… A atual prática só promove a especulação e delega nos “atores” habituais a responsabilidade de mitigar os efeitos da inflação.
Na verdade, a atuação do BCE, se por um lado é desejável para estancar esta rota inflacionista galopante, por outro só recorre a mecanismos (aumentos das taxas de juros) que condicionam com muita expressão o consumo.
As empresas portuguesas, recentemente saídas de uma pandemia, estão absolutamente concentradas em contribuir para a economia, promovendo o crescimento e a geração de riqueza. Por todas as razões, especialmente pelos “débeis” níveis de crescimento da nossa Economia nos últimos anos… não nos podemos permitir a ter uma redução do consumo.
Todos sabemos que a recuperação de consumo perdido tem um custo 5 a 7 vezes superior ao associado ao regular crescimento das organizações.
Então e quando é que a inflação deixará de ser um tema? Uma certeza temos, nos próximos anos não voltará aos níveis próximos dos últimos 15 a 20 anos, nem porventura será desejável.
Por outro lado, após a dinâmica de subida é previsível o aparecimento de um ciclo de ajustamento em baixa, o que criará ainda mais desafios às empresas… a antecipação de eventuais baixas de preços e o impacto das mesmas nas propostas de valor, terão consequências muito expressivas na competitividade de preços.
Em conclusão, vamos chamar a nós, a gestão do “destino” das nossas empresas, elegendo o tema da inflação e gestão de preços como algo onde podemos muito positivamente influenciar o resultado.
Dedicando recursos próprios ou recorrendo a Especialistas de Compras, esta tem claramente que ser uma prioridade estratégica das organizações. Promovendo um maior equilíbrio em toda a cadeia de valor, gerindo adequadamente os aumentos de preços por forma a estimular o crescimento das empresas.
Vítor Ribeiro Gomes | Owner & CEO | Pendular – Gestão de Compras e Contratos
Nota: O artigo foi primeiramente publicado no Observador, tendo o autor dado autorização para a republicação do mesmo.