Decorreu no passado dia 28 de junho, a primeira edição do TechLogistics 2023, um evento focado no papel da tecnologia no setor da logística, organizado pela Maeil, em parceria com a Supply Chain Magazine e a Microsoft. “Inovações e Tendências Tecnológicas na Logística e Supply Chain” foi o mote que conduziu as sessões de partilha de conhecimento, levadas a cabo por vários profissionais da área.
André Vala, senior cloud solution architect da Microsoft, abriu o ciclo de conferências com um tema que está na ordem do dia: “Inteligência Artificial” (IA). Indicou que apesar de nem todos terem esta perceção, a IA já está há muito presente no nosso dia-a-dia, como o simples facto de desbloquear o telemóvel através do face ID. André Vala refere que “o impacto, hoje em dia, já é grande, e ainda será maior no futuro”.
Durante o seu discurso, abordou o impacto da Inteligência Artificial Generativa, e um dos modelos mais populares atualmente: o ChatGPT. Aconselhou a que seja “usado como fonte linguística e não como fonte de conhecimento”, uma vez que tem um grande potencial para gerar texto através de um prompt (ordem), para um propósito específico, mas não a nível de conhecimentos baseados em factos, pois pode nem sempre ir buscar informação a fontes fidedignas.
“Financiamento de Projetos de Inovação Supply Chain e Logística” foi o tema da sessão seguinte, conduzida por Artur Dias, sócio e fundador da Marlo Portugal e Chief Customer Experience Officer da Mixmove.io. Começou por fazer uma breve apresentação da Marlo, empresa que fornece soluções de consultoria e tecnologia para clientes do setor dos transportes e logística, cuja proposta de valor é apoiar os intervenientes deste setor a captar financiamentos para desenvolver os seus projetos de inovação.
A abordagem da empresa passa por identificar necessidades de financiamento a fundo perdido, de seguida, criar o portfólio de projetos, selecionar programas de financiamento apropriados, elaborar candidaturas e atualizar o portfólio. Um dos casos de sucesso é a Agenda Nexus, um consórcio representativo da cadeia de valor, liderado pelo Porto de Sines, que inclui exportadores, operadores logísticos e de transporte, bem como empresas vocacionadas para exportar tecnologia, cujo objetivo é digitalizar e descarbonizar o corredor logístico do Porto de Sines. Artur Dias terminou referindo que “o retorno deste tipo de iniciativas é muito alto”.
Simplificar e otimizar processos
De seguida, o foco dirigiu-se às start-ups e à importância da tecnologia no setor dos transportes. A sessão foi liderada por Sebastian Cazajus, CEO e cofundador da Cargofive, que começou por fazer a comparação entre a facilidade de comprar uma viagem online, e a complexidade de agendar um shipment, uma vez que implica uma grande burocracia. É necessária mais facilidade e rapidez nestes processos, bem como transparência. “Os shippers querem informação em tempo real, e os transitários têm de conseguir dar-lhes essa visibilidade”, afirma Sebastian Cazajus.
O CEO apontou a flutuação dos preços de mercado como um dos desafios deste setor. No caso dos shipments, o preço está relacionado com o espaço restante do navio e a partida do mesmo. Por outro lado, há ainda o problema da falta de estandardização de dados que, nesta área, é um desafio enorme. É perante este cenário que a Cargofive atua, através de um algoritmo inteligente que converte os contratos com armadores em formatos standard, mais simples. Através de poucos cliques, a Cargofive consolida preços e horários num lugar só, tornando todo o processo mais simples e otimizado.
Além da Cargofive, a Meight também participou no evento. António Reis, cofundador, apontou que um dos maiores problemas no transporte terrestre são ineficiências operacionais por falta de tecnologia, e que, por ser uma área que ainda funciona offline, os dados estão “espalhados por todo o lado”. Neste setor, os processos ainda são muito arcaicos e pouco eficientes. Assim, é importante considerar a utilização da tecnologia. Um dos exemplos apresentados por António Reis, foi a substituição do Excel por plataformas de dados. Desta forma, existe uma conciliação de todos os dados operacionais, integração nativa com qualquer software (telematics, insurance, digital brokers, finance), uma base para desenvolvimento de aplicações de inteligência artificial, e comunicação nativa com todos os stakeholders (motoristas, expeditores, destinatários, subcontratados).
O potencial da blockchain
Ainda na visão de otimizar processos, Hugo Duarte Fonseca, da Maeil, trouxe à sessão a importância de usar a blockchain para desmaterializar documentos como a Bill of Lading (BL) ou um CMR. O facto de este tipo de documentos ainda existir em papel, constitui um desafio, uma vez que existem muitos transportes e muitas rotas. Apontou as vantagens de tornar estes documentos físicos em documentos digitais, ou seja, eBL e eCMR, nomeadamente a entrega instantânea, a integridade do documento, baixo custo, e a segurança dos dados. O motivo pelo qual a utilização da blockchain neste sentido é benéfica prende-se com a sua imutabilidade, transparência, auditabilidade, interoperabilidade, descentralização e segurança.
Para falar da Agenda Nexus, o evento contou com Cláudio Pinto, coordenador da Agenda Nexus e diretor de inovação e sistemas de informação da Administração dos Portos de Sines e do Algarve (APS). Durante a sua intervenção, Cláudio Pinto apontou os principais objetivos da iniciativa, sendo eles: a criação de 1147 novos empregos até 2030; reduzir as emissões de CO2; chegar até aos 60 milhões de euros em exportação de tecnologia até 2030 e aumentar a performance da logística portuguesa.
Negócios têm que acompanhar a evolução
A primeira mesa redonda da TechLogistics teve como mote “O Futuro da Tecnologia nos Meios de Transporte”, a qual contou com a participação de Artur Dias, Hugo Duarte Fonseca, António Reis, Sebastian Cazajus e Cláudio Pinto. A sessão promoveu o debate sobre o ponto de situação da digitalização na área do transporte, o que ainda falta fazer e quais os entraves.
“Muitas vezes a mudança é mais mental do que financeira”, afirma Hugo Duarte Fonseca. Esta foi uma ideia bastante presente durante toda a sessão, e que foi corroborada por Sebastian Cazajus. “Os negócios têm de acompanhar a evolução da tecnologia, e o desafio é, muitas vezes, educar os profissionais para darem esse passo”. Por sua vez, António Reis acrescenta que “estamos a falar em digitalizar toda uma forma de trabalhar”, e que isto constitui um desafio. Ainda assim, é necessário haver este esforço. Cláudio Pinto refere que “o potencial dos projetos não é atingido se não se fizer a transição digital”.
O financiamento, também pode ser visto como um entrave à adoção de tecnologia? Artur Dias afirma que “hoje em dia, com a disponibilidade de programas, quem tiver uma boa ideia ou projetos digitais, tem todas as condições para submeter uma candidatura e ter sucesso”, e que é mais fácil obter financiamento, desde que haja uma boa ideia e vontade.
Luís Filipe, business representative da DCbrain, trouxe à TechLogistics o tema “Logistics and Transportation Savings with AI”. Durante o seu discurso apontou três estratégias para otimizar a performance através da AI: um digital network twin (gémeo digital para cada rede), que reduzem os tempos de cálculo; Inteligência Artificial Híbrida, que se adapta aos desafios do fluxo de transporte; e Bibliotecas de Interface do Usuário, que cria interfaces do usuário personalizadas adaptadas a cada rede.
Por sua vez, a Ar Telecom, prestadora de serviços com uma oferta de soluções integradas de comunicações e tecnologias de informação, pensada para as necessidades específicas do mercado empresarial, também marcou presença no evento através de Pedro Morgadinho Nunes, diretor comercial, que apresentou as soluções da empresa.
Tecnologia responde à complexidade
Durante o TechLogistics também se abordou a questão da digitalização do processo de compras e gestão de armazéns avançados. Daniel Baptista, business developer da Cegid Primavera, começou por fazer um breve levantamento das tendências e desafios atuais, como cadeias de abastecimento incertas, otimização, planeamento e transparência/visibilidade de informação, ou pressões para redução de custos.
A nível de soluções, apresentou a Omnia, uma plataforma ágil para soluções na cloud. É caracterizada pela sua agilidade, rapidez e flexibilidade, e pode ajudar as empresas nos processos de compras, recursos humanos, gestão de projetos, serviços, e marketing e vendas. No que diz respeito ao processo de procurement, dá suporte desde a criação da requisição até à aprovação da fatura do fornecedor para pagamento, nomeadamente: efetuar pedidos de requisição, disponibilizar acessos a fornecedores para responder a pedidos de cotação, aprovar faturas de fornecedores para pagamento, e controlar os fluxos de aprovação por etapa. Além desta solução, Daniel Baptista também falou sobre o Eye Peak, a nível da gestão de armazéns.
Quase a terminar o dia, foi a vez de Quitéria Andrade, coordenadora de carga e correio da SATA, apresentar algumas das transformações digitais que estão a ser efetuadas na empresa. Entre elas está o Auto-Rebook já aplicado este ano, em fase de testes está o ICS2 (Import Control System), e perto da fase de testes encontra-se a digitalização do correio. Em análise está o Optical Character Recognition.
A encerrar a TechLogistics sucedeu-se a última mesa-redonda, que contou com Daniel Baptista, Pedro Morgadinho Nunes, Júlio Borges, gestor de projetos da Rangel, Tiago Silvestre, Diretor de IT da Abreu Logistics, e Nuno Lima da Luz, presidente da Associação Portuguesa de Blockchain e advogado na Cuatrecasas. O painel debateu a digitalização nos negócios e uma das conclusões é que as empresas devem procurar as melhores práticas e soluções para as suas necessidades. Muitas vezes, as empresas integram tecnologia que nem sempre é aplicável a determinadas circunstâncias, revelando-se um gasto desnecessário. No caso da blockchain “já há muitos casos de sucesso, mas tem de ter lógica de utilização, ou seja, tem de se analisar se faz sentido a sua aplicação”, afirma Nuno Lima da Luz.